Vale pelo transe, vale pelo corpo que vira condutor de energia. Quanto maior é a corrente, maior é a experiência. Você vai rodando, de preferência, mãos dadas com quem não conhece. E a onda vai aumentando. Maré cheia de ritmo, imitando as ondas do mar. Somente quem é praieiro sente o cheiro da maresia onde quer que dance uma ciranda. Cuida que o pé esquerdo bata o tempo mais forte. Cuida que a tua mão suba e desça. HEYYYYYY.... Heyyyyyy
Eu danço ciranda desde os cinco anos. Era vizinha de dona Duda, aquela que aparecia nas propagandas das Casas José Araújo... uma música linda que dizia assim: “Vivemos nesta terra forte, neste sol do norte e luz de amor... sorrindo vamos para praia, de maiô, de saia, o verão chegou”....Eu parava tudo o que estava fazendo quando ouvia a música que vinha da TV. Raros os momentos de TV ligada na infância. A gente ligava o transformador primeiro. Depois, a TV demorava pra abrir a imagem. Mudar de canal era girando um botão que fazia um barulho danado: TEC,TEC,TEC......
Meados dos anos 1970... não tinha muito a se fazer em Pau Amarelo. A gente esperava o verão chegar pros veranistas animarem um pouco mais. Na safra, a gente colhia caju das casas que ainda não estavam ocupadas. Depois, secava e assava castanha numas latas de doce. Um bando de menino e menina acocorado em torno do fogareiro ao lado da casa do Praciano, no terreno baldio. Minhas blusas ficavam com a marca dos cajus. Era nódoa e não existia vanish.
De noite às vezes tinha ciranda lá em Dona Duda, aquela do comercial. De dia, Dona Duda vendia peixe. De noite, cantava ciranda. Gostava de entrar na roda em qualquer lugar, o povo soltava as mãos pra ampliar a roda, pra entrar mais gente. Era o ápice da comunhão. E rodava devagar... HEYYYYYY... Heyyyyy. Dançava menino, menina, homem, mulher. Pescador e comprador de peixe.
Eu tinha o maior orgulho de dizer que eu morava “na primeira rua à esquerda depois da ciranda de Dona Duda”. Da minha casa, quando ainda não existiam os prédios, a gente ouvia o toque da ciranda. Eu ficava num pé e noutro. Decorava as toadas. Quando eu chegava, aquele belisco de gente, Dona Duda vinha me abraçar. “A filha de seu Maurício mais Dona Maria”, ela dizia. E eu tratava de me meter logo na roda. Heyyyyyy... Heyyyyyy
De vez em quando, a ciranda virava coco de roda. Vixe Maria que delícia!!! O samba da beira do mar. Me ensinaram a imbigada, me ensinaram a segurar na saia e girar. Arrastando a chinela no chão pra dar um ar de faceirice. Era peixe de coco, cocada de sobremesa. Soprava o vento, descia o suor.
Talvez por isso ainda hoje das poucas coisas que não consigo resistir são o coco e a ciranda. Me meto na roda e deixo o chacoalhar me levar. O pé firme no chão e o tronco balança que nem coqueiro de um lado pro outro, nesse leva e traz.
Me pego sorrindo. Me pego cantando até as músicas que não conheço, de olhos fechados. A graça é essa. Se aprende assim também. Me pego na mão da menina de cinco anos.
Pois... este texto é um agradecimento. À Dona Duda, que animava as noites na beira do mar. À Lia, que me encantava quando ia às vezes visitar o Janga... E à Yane Mendes, que com sua lente captou meu momento de deleite, de desprendimento, de infância. O olhar da artista não me fotografou. Foi mais profundo: registrou o momento em que a menina saiu da toca e se revelou. Esta ciranda não é minha só. Ela é de todos nós. Ela é de todas nós!
Eu danço ciranda desde os cinco anos. Era vizinha de dona Duda, aquela que aparecia nas propagandas das Casas José Araújo... uma música linda que dizia assim: “Vivemos nesta terra forte, neste sol do norte e luz de amor... sorrindo vamos para praia, de maiô, de saia, o verão chegou”....Eu parava tudo o que estava fazendo quando ouvia a música que vinha da TV. Raros os momentos de TV ligada na infância. A gente ligava o transformador primeiro. Depois, a TV demorava pra abrir a imagem. Mudar de canal era girando um botão que fazia um barulho danado: TEC,TEC,TEC......
Meados dos anos 1970... não tinha muito a se fazer em Pau Amarelo. A gente esperava o verão chegar pros veranistas animarem um pouco mais. Na safra, a gente colhia caju das casas que ainda não estavam ocupadas. Depois, secava e assava castanha numas latas de doce. Um bando de menino e menina acocorado em torno do fogareiro ao lado da casa do Praciano, no terreno baldio. Minhas blusas ficavam com a marca dos cajus. Era nódoa e não existia vanish.
De noite às vezes tinha ciranda lá em Dona Duda, aquela do comercial. De dia, Dona Duda vendia peixe. De noite, cantava ciranda. Gostava de entrar na roda em qualquer lugar, o povo soltava as mãos pra ampliar a roda, pra entrar mais gente. Era o ápice da comunhão. E rodava devagar... HEYYYYYY... Heyyyyy. Dançava menino, menina, homem, mulher. Pescador e comprador de peixe.
Eu tinha o maior orgulho de dizer que eu morava “na primeira rua à esquerda depois da ciranda de Dona Duda”. Da minha casa, quando ainda não existiam os prédios, a gente ouvia o toque da ciranda. Eu ficava num pé e noutro. Decorava as toadas. Quando eu chegava, aquele belisco de gente, Dona Duda vinha me abraçar. “A filha de seu Maurício mais Dona Maria”, ela dizia. E eu tratava de me meter logo na roda. Heyyyyyy... Heyyyyyy
De vez em quando, a ciranda virava coco de roda. Vixe Maria que delícia!!! O samba da beira do mar. Me ensinaram a imbigada, me ensinaram a segurar na saia e girar. Arrastando a chinela no chão pra dar um ar de faceirice. Era peixe de coco, cocada de sobremesa. Soprava o vento, descia o suor.
Talvez por isso ainda hoje das poucas coisas que não consigo resistir são o coco e a ciranda. Me meto na roda e deixo o chacoalhar me levar. O pé firme no chão e o tronco balança que nem coqueiro de um lado pro outro, nesse leva e traz.
Me pego sorrindo. Me pego cantando até as músicas que não conheço, de olhos fechados. A graça é essa. Se aprende assim também. Me pego na mão da menina de cinco anos.
Pois... este texto é um agradecimento. À Dona Duda, que animava as noites na beira do mar. À Lia, que me encantava quando ia às vezes visitar o Janga... E à Yane Mendes, que com sua lente captou meu momento de deleite, de desprendimento, de infância. O olhar da artista não me fotografou. Foi mais profundo: registrou o momento em que a menina saiu da toca e se revelou. Esta ciranda não é minha só. Ela é de todos nós. Ela é de todas nós!