quinta-feira, 16 de julho de 2020

Cheguei

"Alguma coisa ali adomingava a alma" A frase de Valter Hugo Mae, no livro "A desumanização", me trouxe de volta. 
Sim, de volta. 
Passei dias sentindo uma necessidade de recolhimento que nunca senti antes na vida. 
É como se eu precisasse não ser. 
Não estar. 
Não chorar. 
Não rir. 
Um tanto faz de coisas e sentimentos...
Uma sensação de entalo.
Uma viagem pra dentro com longas paradas.
Um medo de não saber voltar.
Foi lendo "A desumanização", tão denso quanto a vida, que voltei a olhar pra fora de mim. 
Hoje minha alma me acordou antes do amanhecer. 
Me chamou pra respirar. 
Me convidou para voltar a ver poesia na desordem da pia da cozinha.
Tirei da geladeira manteiga e ovos. Enquanto degelavam, eu lia na temperatura ambiente. 
Bati a mão o bolo de laranja sentindo seus aromas. 
Sentei ao lado do forno, livro na mão, e aguardei pacientemente o ponto. 
O livro falava de vida e morte. 
O bolo foi crescendo e dourando.
Lindo. 
Vocês precisavam ver. 
O processo de cozimento igual à vida.
Deixei esfriar. 
Tirei do forno antes do timer avisar, mas estava pronto. 
Fiz uma calda de laranja com seus gominhos e vesti o bolo, como quem envolve o corpo num echarpe de algodão.
Tudo é alquimia. 
Aos poucos fui chegando aqui. 
Viagem longa. Quando sentei pra tomar um café o sol ja entrava forte pela janela da sala. 
Os meus pés no chao de taco, fincados no hoje. 
Cheguei.

terça-feira, 7 de julho de 2020

colo do tempo




Sentei no colo do tempo, pedi um cafuné.
Acomodada nos seus joelhos.
Pedi pra ele contar histórias de mim, pra contar as verdades e as mentiras que eu acredito.
Como uma avó amorosa, que transforma pedaços de bolo em fábulas.
Que reforma vestidos antigos.
Que aconchega.
Eu estava aboletada.
Eu, minha criança e tantas outras faces, todas sentadas ali.
Sentei no colo desta deusa e pedi uma trégua.
Sentei no colo do tempo.
Pra sentir melhor as transformações.
Pra olhar pra dentro.
Pra acalentar a infância que nunca termina.
Sentei no colo do tempo, pedi pra me ninar.
Sentei no colo do tempo e finalmente conciliei o sono.
Sonhei que estava no seu seio.
Alimentei meus desejos. Afaguei meus sentidos.
Sentei no colo do tempo na esperança de parar.
Mas ele me levou consigo.

Horizonte

 Pausar.  Simples e necessário! Tempo restaurador. Arrumar as gavetas da cabeça, acariciar a alma, alentar as dores, afagar os prazeres. Fec...