sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Relicário




Móveis antigos não contam histórias.... Tem gente que pensa assim.
Eu não. Tanto que eu vivia no pé da máquina de costura Singer da minha avó.
Olhava aquela agulha que ia e vinha, movida pelo pé da minha costureira particular.
Na minha cabeça, a boca da maquina (a agulha) dublava as histórias que a minha avó contava, que nem nos filmes da sessão da tarde.
Ela ia falando e eu ia olhando ali pra máquina que engolia pano. Ás vezes minha avó parava de usar a máquina, fazia qualquer coisa à mão, e eu achava que perdia a graça.
Minha avó se assustava, porque todos os netos corriam, brincavam, ia pra rua, caiam da bicicleta... e eu, pra ela, era uma menina quietinha, sempre à beira da máquina, esperando a hora de provar o novo modelo.
“Roupa nova de dono velho”, ela dizia, reformando as roupas das minhas tias pra mim.
Que nada! Eu ficava ali dando nome àquela engrenagem. Às vezes, era minha avó mesmo. Podia ser também a bruxa da Branca de Neve. Pensava também que a “boca da máquina” era mágica, era feiticeira. Entrava linha, saía uma roupa linda. E num é que era mesmo? Minha avó era a manipuladora daquele objeto mutante. E quem queria saber de bicicleta depois disso tudo? Nem de televisão. Mais nem de rádio!!!
Minha avó contava as histórias de quando era menina, que mandava lavar as roupas em Paris, de navio.... e eu ia junto.
A máquina ia conversando comigo.
No final, sempre tinha um vestidinho novo de presente, uma blusa com um babadinho....
Talvez por isso, pra guardar esta lembrança, eu adore móveis antigos e tenha pedido aos meus irmãos justamente a máquina de costura da minha avó como herança.
Ninguém se opôs.
Não sei pregar um botão.
A máquina, coitada, fechou a boca, enferrujou. O pé de ferro ainda é lindo.
Ah se aquela máquina falasse.....

2 comentários:

Jorgeane disse...

Linda minha irmã.

Beijos e te amo.

Obs.: Quero escutar essa máquina.

Germana Accioly disse...

cuma!

tanta coisa que a máquia diria, se tu tivesse ouvido as histórias dela...

beijo

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