segunda-feira, 14 de maio de 2012

A parede



Escolhi uma parede de fotos antigas, com uma cor rosinha no fundo.

Escolhi a primeira cristaleira que eu comprei na vida, na rua da Conceição - e finjo só pra mim que é herança - pra guardar minhas xicrinhas desgarradas e antigas.

Uns santos, umas fotos avulsas, o casamento da sogra, a foto dos avós.

No fundo, no espelho, dá pra ver meu vestido verde esperança que eu escolhi pra usar no dia das mães este ano. O sofá azul natiê me caiu muito bem também. Compôs, diriam os diretores de arte.

Compôs, mas não reverberou. O dia acabou no meio, abafado pela locução do futebol.

Ninguém viu o vestido. Ninguém, não. somente duas pessoas me interessavam naquele dia. As duas que me fazem mãe.

Mas a paixão falou mais alto. Eles tentaram esconder, só que sou mais experiente pelo menos. Paixão não se esconde, crianças. E eu, mãe de primeira viagem nos assuntos de filhos adultos, me perdi no meio. No meio do almoço, no meio do dia, no meio do meu dia.

Fui ficando pionga, fui me escondendo atrás da cristaleira. Quem dera o espelho me sugasse no seu mistério.

Fiquei eu e a parede de fotos antigas. A casa vazia, silenciosa em pleno domingo de tarde.

Os rapazes ruidosos gritavam em outros lugares.

Pois bem, eu e a parede.

Um dia eu estarei ali, pendurada na parede. Só saudade.

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