A cheia tinha levado na minha infância quase a casa toda.
Morava na Estrada do Encanamento.
Lembro pouco de 1975.
A nossa retirada de casa às pressas,
Um banquinho encostado na parede na janela do apartamento da minha tia, onde eu refugiada subia e via lá embaixo as coisas passeando pelas águas.
Eu tinha 3 anos. Não entendia a tristeza.
Admiro a beleza das águas até hoje.
Na volta pra casa a chuva deixou a marca de um metro e meio.
Do tamanho da minha mãe, eu pensava.
Lembro das fotos que restaram quarando nos varais, algumas manchadas.
A gente passando sabão no alpendre imenso pra tirar a lama.
São cenas perdidas.
Recife e chuva combinam.
Eu nunca tinha sentido tristeza de chuva até o dia em que a água veio se espreitando e invadiu o piano.
Invadiu e paralizou.
Imobilizou.
Nada sobra da alma molhada.
Quando seca, sem esperança, muda de cor.
Meu piano mudo.
Eu muda.
Hoje é noite de chuva e ele voltou.
Vou tocar pra água e seus ventos.
Porque a dor da espera escorreu feito correnteza.
E a música deixou uma marca maior que eu.
Hoje tenho quase nada a mais que um metro e meio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário