quarta-feira, 24 de março de 2010

Boletim de ocorrência

O cano frio e árido encostou na minha testa. Assim, não dava pra pensar em nada. Eu então me vi paralisada. Um segundo rico, de vida, se passou.
O cano já não tão frio tinha atrás de si um homem. Sua mão firme, sua voz morna atinavam a frieza da sua alma.
Nem me doeu a bolsa que ele levou, muito menos o carro tomado subitamente numa encrizilhada qualquer.
Doeu-me aquele freio. E o homem apontou de longe o cano: passa a aliança!
Nossa!!!!! era ela ou a vida.
Foi ela.
Sumiram os quatro revólveres na rua deserta.
Senti então que já podia pensar. E pensei que fui roubada na alma. No meu sagrado, no meu cuidado.Minha mão não tremia a ausência.
Olhei ao redor e tudo parecia estar no mesmo lugar. Um passo a frente e vc não está mais no mesmo lugar.
E se tivéssemos virado à esquerda?
E se pegássemos o semáforo vermelho?
E se os meninos não tivessem atrás?
E quanta culpa!!!!
Quero minha vida de volta mais inocente. Quero minha certeza de que o que é meu, sempre será.
Quero poder olhar as flores como se não fossem as últimas e ver meus meninos com minha paz no coração.
Quero o sabor de volta à minha boca e o cheiro da rua no nariz.
Eles devolveram tudo, deixaram minha história abandonada numa rua deserta. O celular ligado, os documentos em desalinho. Devolveram, diriam alguns.
Mas arrancaram de mim alguma coisa.
O que não se presta queixa. O que não consta no boletim de ocorrência.
Tudo passou. Foram três minutos, no máximo.
E ao final, o que fazer?
Escolher o caminho de sempre, parar nos mesmos sinais, olhar com o mesmo medo e depois fugir pra dentro de si....

2 comentários:

Princess Deluxxe disse...

caramba!
caramba!
caramba!

mil exclamações!
por vc
pela vida
pela realidade.

...

Germana Accioly disse...

pois é, querida.....

às vezes eu penso que foi um filme que eu assisti....

Horizonte

 Pausar.  Simples e necessário! Tempo restaurador. Arrumar as gavetas da cabeça, acariciar a alma, alentar as dores, afagar os prazeres. Fec...