quinta-feira, 25 de abril de 2019

Receita pra esquecer



Esqueça. Eu tenho feito o exercício diário de esquecer também.
No mundo inteiro, pessoas lutam, se exercitam, pra não esquecer.
Enquanto eu afasto os pensamentos, outros se agarram fervorosamente aos lampejos do presente.
Eu quero esquecer teu passado recente, teus devaneios ébrios, as narrativas ao vento.
Esqueça. Eu tenho feito o exercício assiduamente. Antes de esquecer, a gente lembra. Apagar a memória não é um projeto fácil. Nem uma tarefa simples.
O pensamento compulsivo de esquecer, antes, exaure a lembrança. Esgota.
Começa aos poucos. A cada dia você esquece um pouco. Um cheiro, uma frase, aquele abraço.
Outro dia uma tia querida, revolucionária na juventude, beirando os 85 anos, me falou assim: eu te amo tanto... mas não lembro mais teu nome. Tanta poesia numa fala tão triste....Ela vibrando no amor, alimentando a vida, numa dignidade, numa necessidade de estar presente e inteira, mesmo quando vai se esvaindo o desenho da rotina. Sigo como sempre, desde criança, me inspirando nela. 
Começa aos poucos, não esqueça.
Vou esquecendo aos poucos. Ensinando o corpo a omitir. A mente, sigo doutrinando, que nada de verdade aconteceu. Foi tudo um pesadelo daqueles que a gente acorda jurando que era verdade. E de tanto repetir, vou acabar acreditando.
Aos poucos, apago também da alma. Bem aos poucos, como uma borracha que, de tanto trabalhar, esquenta o papel, mas deixa seu rastro borrado. Não é difícil esquecer um par de horas, aquela noite parca de luz.
Daqui a pouco, tudo não passa de uma mancha, uma aguada.
Esquecer é quarar com alvejante um tecido ao sol. Despigmentando seus corantes, amainando as vibrações. 
Se alguma coisa ainda eu possa sugerir, nesta amnésia que vai matando a história, antes que seja tarde, esqueça.
Melhor, enquanto ainda temos memória.

domingo, 14 de abril de 2019

Pele

Você saiu.
Por dentro, um tambor ritmava a música da vida. Reverberando no corpo todo, acordando as células, abrindo as veias, levando um sangue novo. Por dentro havia oxigênio, finalmente.
Nada ficou de você comigo, a não ser os desenhos feitos aqui e acolá pela urgência da barba. 
A não ser pelo cheiro, volátil, descomprometido, que impregnou no meu vestido. Aliás, passei o dia seguinte com aquele vestido, na doce tentativa de adiar a sua partida.
Você não deixou nenhum vestígio visível, nem sequer uma pasta de dente na pia. Uma toalha fora do lugar, talvez...Tinha um copo vazio sobre a mesa nua da sala, nada mais impessoal.
Por dentro, você inaugurou em mim a vontade de ser. A imensa capacidade de estar. 
Confesso que sofri de um certo torpor. Isso sempre me acomete em momentos extremos de emoção. E ao longo do dia saí juntando as memórias, como quem arruma uma casa e recolhe objetos em desalinho depois de uma grande festa.
Um diálogo embaixo do piano, um beijo profundo jogado em cima da poltrona da sala. A minha fantasia e a tua espera no corredor.
A porta fechou.
A poesia desenhada na minha alma feminina é das mais profundas. A beleza de duas ou três horas vividas à revelia do destino, revolucionando as rimas. 
Poesia abstrata, na pele concreta.
E voltamos a apertar as mãos na rua. Vamos falar de política nos bares, brindar e rir. Seguimos contando como estão os filhos, e como foi aquela semana de trabalho. Um dia, vamos nos abraçar e falar há quanto tempo não nos esbarrávamos.
São os caminhos da vida.
A arte dos desencontros.

sexta-feira, 12 de abril de 2019

pérolas da Mamede.


Foi o teu feminismo que lascou tudo. 

Foi você trabalhando de dois em dois anos em campanha eleitoral que fez naufragar o barco.

Qual era do defeito que ele tinha e que você só descobriu agora, mais de 20 anos depois??

Uma pessoa tão legal, você jogando pela janela..... 

Faz um favor pra mim? Conversa mais com minha mulher não, porque vai que ela aprende estas tuas ideias de separação também.

 Nesta idade você não arranja mais ninguém. Melhor voltar pra ele. 

Quem sai de casa, abandona, perde totalmente a razão. 


E você saiu porque tinha outro né? Ta na cara! 

Cuidado... estas ideias liberais, de mulher liberada, nenhum homem aguenta não. 

E ainda deixa o moço com uma mão na frente e outra atrás? 

Você acha que ainda vai encontrar alguém mais legal do que ele? Jura? Se cuida..... 

Desculpa, amiga.... mandei aquela foto sem querer... é que vocês sempre brincaram carnaval e agora vi ele brincando e achei legal mandar pra você.

 Sei, sei... ele é uma pedra... mas vc ama esta pedra. Volta....

terça-feira, 9 de abril de 2019

Egos bomba

Quero Mais. Mais que estar num canto do quarto, mais que estar pela metade, mais que conviver. São egos bomba ambulantes prestes a promover um atentado ao próximo. São almas inquietas, com baixa taxa de amor. NÃO quero mais. Quero querer. Quero escolher a música e o passo da dança. Desejar o amargo ou o doce, Experimentar o salto e o voo. ansiar pela a queda. Implorar pela vertigem. Explodir no ar.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Uma carta para quem nunca vai ler

Que bobagem, que estupidez, escrever uma carta para quem nunca a lerá. Que estupidez!!!!!! Escrever uma carta para dizer que sim, o amor parece que se foi, mas insiste em ficar. Parece que se foi, mas se esconde na chaleira do café, na manhã dos domingos. Escrever uma carta ao amor que já se foi. Ao amor que eu mesma quis que se fosse, que desapregasse da minha pele. Ao amor tóxico, ao amor tristeza, ao amor covardia, ao amor vazio. Escrever esta carta para ninguém ler. Mas para que saísse de mim mais um pedaço deste sentimento que afoga. Oxigênio em ambiente rarefeito. Fui embora imaginando que ficaria. Fui embriagada de um éter de vida que talvez nunca mais eu sentisse o cheiro. Tive alucinações de vida. Tive desilusões de matar. Pelos poros eu eliminava meu prana, energia que movia os sonhos. E, no entanto, a carta sopra nos meus ouvidos talvez como sendo mais um suspiro. Um pedido que sim, vá. Um pedido para que deixe alguma coisa de mim ficar. Um apelo ao meu ser, que seja. Que assim seja, que se respeite, que se ame, que se aninhe. Uma carta para quem nunca me leu. Uma carta para quem jamais me lerá. Um documento vazio de intenção, pleno em mim. Que bobagem, que estupidez, repito! Escrever uma carta de amor para quem jamais decifrou os signos, símbolos e métricas da alma que escreve. Uma carta para analfabetos funcionais, que não interpretam as linhas vitais. Chegue este amontoado de palavras aos seus olhos, não traduzirás. E ainda assim, teimo em seguir contando a minha história. Porque basta que eu mesma a compreenda e a traduza. Que eu veja nas suas entrelinhas, meu sentido. Que eu seja minha própria tradutora e intérprete. Domingos são dias de desperdiçar mesmo... eu, em frente ao computador, a escrever um bilhete para quem nunca o lerá....

Horizonte

 Pausar.  Simples e necessário! Tempo restaurador. Arrumar as gavetas da cabeça, acariciar a alma, alentar as dores, afagar os prazeres. Fec...