quarta-feira, 28 de julho de 2021

amor roubado

 

A saudade me paralisou

Engasgou a infância

Meus dez anos tomados de assalto


Perdi tanto:

as flores no quintal

as histórias antes de dormir


Um amor roubado


Os finais de semana programados

e a nossa tristeza quinzenal

eram traduzidos

nas paredes grossas

nas janelas pequenas

no pão torrado demais


Passei a acordar de madrugada

a  procurar seus vestígios

passei a querer esquecer 

mas era a dor que não passava


Lembro do cheiro

dos móveis comprados de segunda mão

na Rua da Conceição:

a mesa redonda de jacarandá

as cadeiras de madeira com encosto e assento de palha trançada

os lençóis estampados com babado azul

o jogo de damas

os brinquedinhos de chumbo


Lembro dos olhos dele

nos tempos mais turvos

quando me visitava na escola


Queria esquecer


Cresci silenciando

emudeci amadurecendo

a saudade que sentia

dos sanduíches de bolacha cream cracker com geleia de mocotó

de ser “embrulhada como múmia" 

da vitamina de abacate que não gostava de tomar de manhã

de visitar o peixe boi na Praça do Derby

de comer sanduíche de queijo no drive in


Trancaram meu peito

Perdi a chave

Construí um muro

Escondi a poesia


Era tudo saudade do meu pai

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