terça-feira, 13 de agosto de 2013

Baião de dois à Lindalva



No Ceará cuscuz é pão de milho. Lanchar é merendar. Paçoca é de carne de charque. No lugar da feijoada, baião de dois. Com queijo coalho dentro. Banana como acompanhamento.
Baião é dança e alimento.
Eu sou a primeira pernambucana da família. Vivi no Recife a vida toda, mas era no Ceará que passava as férias. Nada de praia ou cinema. isso tinha aqui no Recife.
Minhas férias eram no depósito de material de construção do meu avô materno Zeca. Ele e vovó Lindalva formavam uma família de verdade. Tudo muito simples. Nossa brincadeira era no fundo do quintal. Às vezes eu subia na carroça do burro pra ir entregar areia, cimento...
Mas, para as meninas, a graça eram as panelinhas de barro que minha avó separava pra gente fazer os tais guizados. No Ceará, guizado é brincadeira de menina na cozinha.
Vovó era quieta, reservada. Mas ia lá pro fundo do quintal cozinhar com a gente. Tudo era muito sério. Fazer o fogo. Cortar as bananas em rodelas. Colocar a água e o açúcar e esperar ficar pronto. O doce demorava uma vida pra chegar no ponto!
Mas valia a pena.
A mesa deles tinha três metros e meio de comprimento. Era pra abrigar os 11 filhos, os amigos, os agregados, os netos. E  depois de comer o baião de dois e a paçoca com carne de charque bem tostadinha que a gente se revezava batendo no pilão, vinha solenemente o doce feito pelas meninas no guizado do fundo do quintal.
Era a nossa iguaria.Vovó não era de brincadeira, mas me ensinou a brincar com as panelas.
Hoje, talvez em homenagem a ela, mantenho em casa uma coleção de panelas de barro. A gente cozinha quase tudo nelas: sopas, arroz, cozidos....
Mas o que levanta o aroma do passado mesmo é quando decido fazer um baião de dois. Vai o feijão verde pro fogo com louro, alho e uma pitada de cominho. Quando estiver quase pronto, jogo o arroz. Na sequência, um refogado de cebola, cheiro verde e tomate. É hora de ajustar o sal.
A esta altura, a carne de charque está fritando com muita cebola. Quando o baião fica pronto, corto umas boas fatias de queijo coalho com uns dois dedos de espessura e vou acomodando ao comprido dentro do baião de dois. Gosto de sentir o queijo mergulhando naquele manjar. Tampo a panela e espero uns cinco minutos pra servir.
O meu pilão não tem o mesmo charme do da casa da minha avó. É um liquidificador mesmo. Mas ta valendo. A paçoca fica ótima!
O resto é colocar um belo cacho de bananas na mesa.
De sobremesa, claro, vai o doce vermelho em rodelas. Podemos atualizar a receita incluindo canela, mas confesso que prefiro à moda cearense.
Com gosto do fundo do quintal da minha avó.

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