segunda-feira, 30 de março de 2020

quaresma





Você passa suas toalhas de banho a ferro? Dobra suas toalhas pelo avesso? Prima em dobrar todas iguais e guardá-las por cores ou simplesmente as esconde dentro do armário? Você já tinha parado pra pensar nisso? Eu, nunca.
Mas esta semana eu parei pra pensar. Pensar nisso é pensar nos nossos padrões. Imaginar nossas crenças e o quanto que elas nos (de)limitam.
Eu sou só. Em meio a tanta gente, estou só. Estou me sentindo muito inteira. Mas só. Para os que eu ainda não falei, saibam. Meus dias não estão sendo fáceis. Sair de casa ou ficar em casa não é a questão.
Eu tenho todo o tempo do mundo para escrever este texto, cozinhar, lavar os banheiros, mandar mensagem pros amigos, falar com meus pais pelo aplicativo em vídeo. Eu tenho tempo largo para meditar. Fazer exercícios. E para depurar este momento contemporâneo da humanidade. Me sinto ligada à humanidade por um vírus. E, para continuar fazendo parte dela e que outras pessoas também façam, eu preciso me isolar. O vírus é um paradoxo. O vírus é uma armadilha. Cuidar de quem cuida e de si, mas com a distância regulamentar de 6 passos.
Eu tenho guardado as toalhas, lavado os lençóis periodicamente. cuidado de tudo.... às vezes parece que o globo terrestre pousa nas minhas costas. Em outras, me pareço moradora do vazio. Habitante do Caos.
Abro o guarda roupa e nele há muitas pistas do que hoje é desnecessário. No armário, sapatos para combinar com as roupas. Tudo guardado.
Lembrei da minha avó materna que nos idos de 1920 era adolescente e contava que suas roupas compradas em Paris só eram utilizadas para ir à missa aos domingos. Era o ermo do Ceará. Uma zona rural. Ela, filha do coronel.
Hoje, na metrópole caótica, vejo o quão desnecessárias são algumas necessidades urbanas. Disse outro dia meio sem pensar ao meu filho que precisaria de quatro mudas de roupa pra esta vida de confinamento. Exagerei. Pra cima e pra baixo. Não tenho mais parâmetros. Pela primeira vez, estou sendo impelida a viver o dia. O hoje. O minuto, o instante. A transitoriedade das relações, o confinamento dos desejos. A quarentena dos projetos de vida.
A quarentena na quaresma. Jejum de atividades, de bares, de praia, de praça. Abstinência do social.
E não é o fim.

Nenhum comentário:

Horizonte

 Pausar.  Simples e necessário! Tempo restaurador. Arrumar as gavetas da cabeça, acariciar a alma, alentar as dores, afagar os prazeres. Fec...